13.10.13

Transcendência

Na sexta à noite fui para a serra; dormimos no sítio só eu e o Par. No meio da manhã de sábado, começou a chegar a parentalha.
Neste semestre, os feriados resolveram cair todos no sábado, o que não é ruim, pois a oficina abriria até meio dia. 
A primeira noite, foi de uma ventania infinda, a tal cruviana estava insolente. Tivemos um sábado nublado e fresco, mas sem chuva.
Ao cair da noite, a energia elétrica se foi, coisa atípica sem tempestades. Usamos velas e lanternas. Banho? Quem tomou, tomou, os outros... de manhã, os primos tiraram leite das vacas no muque.
A questão é que numa noite rural, a escuridão faz a imaginação fluir, ainda mais com certas histórias.
A três meses, perdemos uma prima da roça por acidente de trabalho. Ela entrou num funil que lavava café, para desentupir, seu pé ficou enroscado e dali vinte minutos estava morta por asfixia.
A asfixia por grãos é perigosa: enquanto a pessoa respira, eles vão ocupando o local do diafragma. Ela só estava soterrada do tórax para baixo, e mesmo assim se foi.
Estando a vinte quilômetros da cidade, o resgate fez o que pode para chegar a tempo, assim como o pessoal da fazenda. 
É hábito rural, a parentalha passar a noite no velório, e ela foi enterrada na manhã de sábado. Comoção geral na serra.
À noite, um grupo de jovens foi churrascar num sítio próximo, como de costume, todavia um casal resolveu voltar para dormir na cidade, o espaço na casa era pouco. 
Os dois se perderam com o carro nas imediações do local do acidente, porém nada sabiam do ocorrido. Resolveram voltar para o sítio e pedir orientações mais precisas do caminho.
A garota, filha de um médiun, começou a passar mal. Foi piorando, e quando chegaram ao sítio dos amigos, ela jogou-se no chão, toda possuída por contorções e ruídos.
A cena foi tão terrível, que os jovens usaram dois carros, deixando por lá os outros dois, voltaram à cidade segurando à força aquela moça.
O pai, ao fazer seus trabalhos, relatou exatamente sobre o acidente no dia anterior. O namorado, nosso conhecido, ficou em pânico.
Agora, cada pessoa analisa o acontecido sob um prisma: teria sido o espírito perdido da prima que agarrou a garota sensitiva, por desespero? 
Será ela uma paranormal que captou todo aquele sofrimento na serra e externou a energia dessa forma?
Como seu pai "leu" o acidente sem prévio conhecimento, enquanto fazia um passe na filha? 
E os mistérios entre o céu e a terra continuam... sei que a noite escura me deixou cismada; nada de andar pelo terreiro curtindo a madrugada!
Foto: Serra do Mamonal aos fundos da plantação de lichias.

8 comentários:

  1. Mistérios, histórias, estórias...Vai se saber,né? beijos,chica

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    1. Oi, Chiquinha!
      Nestes acontecimentos, entra em cena o sincretismo religioso, tão comum no Brasil.

      Outro beijão procê.

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  2. Oi Cristina!
    Acho engraçadinho dizer "o Par"...;-)

    Caso bem apropriado para ser discutido no sítio e à luz de velas...
    Transcende à capacidade de compreensão de qualquer cristão...;-)

    Abração
    Jan

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    1. Olá, Jan!
      O "Par", depois de trinta e tantos anos, é quase siamês!

      Pela forma como aparentemente ocorreu, foi uma gritaria só; e na roça se escuta longe... esses jovens não dormirão lá tão cedo.

      Outro abração.

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  3. Oi, Cristina!
    Não sei explicar essas coisas por não compreendê-las direito, mas acredito que somos energia presa na matéria, que quando liberta, se dilui na atmosfera depois de um tempo. Antes disso, essa energia fica indefinida entre um estado e o outro e, na vã esperança de não se diluir, tenta se agarrar em outra matéria (filha do médium). Muitas vezes se agarra a várias pessoas através dos fluídos dos pensamentos (o próprio médium) - muitas religiões tratam pelo termo "encosto" - onde pessoas com espíritos rudimentares ficam susceptíveis a tomarem para si essa energia.
    A melhor forma de persuadir uma alma a tornar seu estado natural é através de repetidos mantras - ou orações, ou ladainhas - por isso alguma religiões "encomendam a alma".
    Se quiser pensar em pessoas mortas, pense no meio de uma oração ou se essa pessoa lhe vier a mente, ore por ela.
    No final, por mais que coloquemos diferenças entre as crenças, todas são iguais. Sejamos como as crianças e olhemos para o céu. Sua prima logo será uma estrelinha!
    Boa semana!
    Beijus,

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    1. Olá, Luma!
      Eu também imagino esta carga de energia, ainda mais pelo fato de ter ocorrido o evento estranho no dia do enterro, onde todos os moradores da serra só tinham aquele acidente em mente.
      Nos faz ver que nada somos, apenas estamos!

      Ótima semana também a ti, e outros beijos.

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  4. Ai, Cristina, que história triste de sua prima, morrendo assim, no trabalho, tão perto de todos e nada puderam fazer! Tadinha!
    Quanto ao caso paranormal, sinceramente, nunca vi nada por perto e nem quero ver, não me ligo nestas coisas e nem sei se acredito ou não, mas o fato é que muitas pessoas contam casos parecidos, gente que absorve, como esponja, os espíritos sofredores por aí.
    Realmente, diante de tanto acontecido e numa noite sem energia elétrica, a coisa fica feia, também não poria o nariz do lado de fora. kkkkk
    beijocas cariocas e ótima semaninha!

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    1. Olha, Beth, aquele pessoal da roça já morria de medo de assombração, agora então...
      Mas foi uma oportunidade para ampará-la em pensamento, numa oração...
      Nestes eventos, nosso raciocínio lógico-matemático cai por terra, perdemos o controle que achávamos que tínhamos.

      Certa vez, minha tia, com o esposo e a filha de três anos foram almoçar na cidade vizinha.
      Quando passavam por uma rua do centro, a menininha começou a afirmar convictamente que morou ali.
      O pai foi investigar e descobriu antepassados naquela casa a muito tempo. Teria a ver com os genes ou reencarnação? Não sabemos!

      Excelente semana também a ti, e beijos caipiras.

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