31.1.14

Balanço

Último dia das férias, do mês, da semana... por todo o janeiro segui com a reeduc e perdi peso: quase CINCO kg! Não estou me gabando, apenas incentivando. 
Por todo o ano de 2008 eu subi de 63 para 68 kg. Fiquei lá até final de 2012. Em 2013 apertei as caminhadas, que antes eram só domingueiras. Quatro noites por semana e engordei... fui para 71.
Percebi que caminhada sozinha nada resolve, então aguardei a virada do ano: reeduc. e corrida. Corri uma média de 16 km por semana, divididos em cinco noites (a pista é aqui na esquina).
Mas o diferencial mesmo, creio que tenha sido a água sete vezes por dia. Tomando água em jejum, eliminei totalmente o café puro, que nunca liguei. Assim, eliminei parte do açúcar diário e a vontade de doce sumiu. Iniciei a rotina dum pequeno café da manhã.
A granola ao menos quatro vezes na semana, suco verde duas, muita fruta e legumes, arroz integral intercalado com o branco, carne com extrema temperança. Nada de refri, suco doce, adoçantes, raríssimas sobremesas. 
É tranquilo comer pouquinho, sabendo que daqui a três horas tem mais. Mastigar devagarinho, sabendo que não irei repetir, também ajuda.
Na feira, comprei bananas e melancia pro "Fiotão"; uma pera, porque tinha da portuguesa; pó de café direto da roça (atrás da alface); alface rubra; pimenta "chapeuzinho de palha"; potinho de mel também direto do sítio; cheiro verde (tem muita vitamina); maçãs fugi e abacate para o Par; cebolas; cenouras;  queijo.
Eu ainda tinha legumes, e frutas que peguei no mercado.
Hoje saí de moto neste calor sem chuvas e tomei água em todo local onde estive. Fiquei sem fome pro almoço.
Bati este suco verde com casca de melancia (verde e branca), manga, um ramo de erva aromática melissa e duas folhas de alface. É apenas bebível. Pode-se trocar a melissa por uma pimenta chapéu de palha, exala um perfume delicioso.
Tomei tudo isso e mais o chorinho que sobrou no copo do liquidificador. Finalizei com duas bolachas integrais e uma de maisena.
Às 9 h 00 comi um pedaço de abacate (sem açúcar); às 15 h 00 comerei uma banana com granola; jantarei às 18 h 00 (arroz, feijão, mini bife e salada; 21 h 00 comerei mandacaru.
Neste verão é mais fácil emagrecer, se movimentar, tomar muita água; a fome é menor. No inverno, tentarei apenas manter o peso, e abusarei das sopas.
Semana que vem volto ao trabalho e reorganizarei a rotina, nada grave. É delícia férias coletivas, pois todas chegaremos perdidinhas ao serviço.
Gostaria de me habituar a pular corda como forma de exercício, estou com as cordas na escola, oficina e casa, porém não me disciplino...

30.1.14

Blanche XLVII

Em Riolama, a rotina segue enclavinhada no avinagrado verão seco, comprometendo colheitas e pastagens. Presos aos espinhosos preços praticados em Corda Bamba, a população, de olhos turvados ao futuro, além da subsistência, conseguirá anoréxicos proventos.
Quando o inverno surgir, ainda mais seco e espantado, não terão como fazer reparos, adquirir equipamentos, renovar a rouparia doméstica, nada... as providenciais doações à igreja, que são uma espécie de "seguro" à comunidade, começam a ralear vagarosas feito um entardecer.
A crua luz do sol tudo alaga, sem nuvem parda a coá-la, cega o apagado cintilão no olhar dos posseiros, alquebrados em torpor à espera que o aguaceiro empape a campina.
Lucano, o vendeiro, necessitou aditar os preços e as vendas caem. A jovem esposa, em cantinela aladainhada e dolorosa, se desdobra entre a ríspida adultez exigida e a afável adolescência desejada, gerando agastados conflitos conjugais em meio às grossas bagas de suor, pela lida feroz. 
O pai, agora viúvo, jaz melancólico e confuso, com momentos de terror que lhe dilatam as pupilas, nuns olhos escancarados de animal espancado. Estira-se ao comprido num canto escuro, alastrando uma expressão apavorada e beiço repuxado, como se um desgosto o penetrasse a carne.
Da cara tão magérrima despendem duas bochechas miúdas, rugosas e pálidas, disfarçadas pela branca penugem rala. Um náufrago em ruínas com escasso sorriso amargo franzindo-lhe o murcho lábio inferior.
Rob, genitor de Blanche, irriga com esforço descomunal, as persistentes plantações anexas à barranca do rio. Nos passos trilhados à rua da vida, repete esta dança de quando em quando. As pastagens já meio secas fazem os animais se locomoverem demasiado, se adelgaçando visivelmente. 
O rio orgástico, todo veemente, perde parte de vigor e diminui o galope. Seu néctar, num brilho agudo e metálico, é evaporado por um constante vento suado, funcionário do sol. O esturro gritado da cruviana desgarrada espalha o lamento da aferrolhada mágoa desta vila.
Numa propriedade, o celeiro ardeu consternado madrugada adentro, por uma faísca insistente que tentou provocar a carga d'água. A constrangida verba da igreja amparará a família, com um mutirão domingueiro para reconstrução. A vitualha? Esta será cedida às migalhas pelos vizinhos, também desfalcados.
Eric, em grandes olhos pestanudos abarcando a paisagem como quem procura um amparo, quebra-se maçado em vagos pressentimentos... mais uma desabrida seca a romper em voz pastosa, insistente.
Blanche, reticente, já nota a moderação no leite e a marcha amiúde das cabras ao regato, com as elevadas temperaturas. O pedregal, presença marcante na montanha dos caprinos, agora se sobressai com violência na paisagem rala.
A propriedade na planície recebe tempestades de poeira, com redemoinhos em mormaço a varrer galinhas e plantações. Os equinos, força da fazenda, necessitam complemento alimentar, contudo nesta época do ano não há. Os animais velhos ficam por lá, num espaço reduzido, mascando limões e gravetos para dar melhor chance aos jovens garanhões.
O Reverendo Albert, com seu cabelo rente e eriçado, farto bigode tapando-lhe a boca, perde aquele amplo sorriso onde lhe somem as pálpebras nas rugas salientes. Os parcos chuvisqueiros são levados em cordas pelo vento, perpendiculares e frágeis fiozinhos prateados.
Fogem os trabalhos extras, as pessoas somem da vila, a caça se apaga nas imediações... pouco se negocia num mundo suspenso à espera das águas, que respingam cá e acolá, numa fugidia ciranda sem respeito.
Orações domingueiras na igreja, encomendas de ritual da torrente aos indígenas, promessas aos espíritos de antepassados... nada muda a decenal estiagem local a admoestar tudo que vive. 
E o áspero vento brame em respiração custosa, derramado impertinente e fatigado, todas as alvoradas, num gritar que morre aflito, polindo as encostas. Os trovões, longe, anunciam uma esperança tola após o relampejar insólito e aberto a chegar pelas frestas.

Cerromaior

Este romance retrata a região alentejana  das décadas de 30 / 40, onde as mulheres de vilarejos, paupérrimas, tinham desafortunadamente um filho por ano. 
Era um círculo vicioso, reproduzindo a miséria das gerações anteriores, e onde um homem se sentia felicíssimo em não ter gerado.
Um Portugal muito diferente da atualidade, onde o pequeno país tem uma das menores taxas de fertilidade da Europa, todavia esta realidade ainda é atual em alguns locais da Ásia e sobretudo África. O Brasil rural também viveu este quadro até meados das décadas de 60 / 70.
A fictícia vila de Cerromaior é rodeada por plantações, onde se destacam duas classes sociais: os latifundiários e os trabalhadores diaristas, que só encontram trabalho em períodos sazonais, sobretudo em época de colheitas.
As mulheres, presas a seus casebres e filhos, lavam roupas para fora e afins, para complementar o orçamento. Os homens, tentando-se menos "presos", vão e voltam, cada vez mais velhos e fracos, devido a vida madrasta desde o acidental nascimento.
A opressão e prepotência do fazendeiro sobre o trabalhador avulso, a necessidade absoluta do trabalho para aqueles homens se sentirem gente, bagunçam a cabeça do protagonista: um jovem burguês que perde parte dos bens para os primos, e pela lembrança da mãe que morreu jovem, acaba ficando do lado dos pobres, apesar da relutante indiferença.
O primeiro capítulo é o final do livro; todo o restante das 251 páginas, é a justificativa deste final. O romance foi adaptado para o cinema em 1980. Escrito em português de Portugal, é gostoso de se ler. 
O exemplar faz parte de uma "sacolada" de livros que minha amiga colheu numa doação feita pela Biblioteca Municipal: me caiu "de paraquedas".
Meu exemplar é da editora "Portugália"; emprestarei para a esposa de nosso colaborador português, creio que ela vá gostar, apesar dele ser do norte.
Imagem: aqui

29.1.14

Cidade

Em época de aulas, fico "internada" a manhã toda na escola, então tenho saído bastante nestas férias e observado a movimentação matinal do centro.
Como o comércio abre tarde! Às nove horas estão começando a chegar funcionários, abrindo as portas timidamente. Eu, que acordei às cinco, já estou cansada de trabalhar, neste horário.
Um fenômeno recente é a presença de muitos idosos fazendo caminhada lenta pelas calçadas do centro, acompanhados de cuidadores. Até a alguns anos, ninguém prestava muita atenção a eles, ficavam largados numa cama.
Muita gente aproveita a fresca para seguir a pé rumo ao trabalho, contudo as motos são muitas e pilotadas por mulheres jovens. Carros com uma só pessoa também imperam. 
É nesse sentido que as motos, embora perigosas, auxiliam muito o trânsito: não ocupam espaço na via e nem nos estacionamentos; são rapidinhas para estacionar, não bloqueando o trânsito; gastam menos combustível (fóssil); fluem melhor, enquanto os carros estão parados nos semáforos.
Se cada moto na via se transformasse num carro, até aqui no interior haveria congestionamentos. E há os moto-taxis, bastante usados pela população. 
Comparados aos ônibus circular, são mais caros, todavia muito mais rápidos, pois pegam e deixam a pessoa no local exato, é só ligar antes de terminar de se arrumar.
Quem mais utiliza os ônibus circular são os idosos, que não pagam passagem, viajam sentados, têm tempo de sobra e morrem de medo de trafegar numa moto. 
Pessoas que precisam economizar ou ganham passe no trabalho também usam coletivos, mas geralmente tem que andar até o ponto, aguardar (passam geralmente a cada meia hora), descer longe do destino e caminhar mais - nada que um bom planejamento não resolva.  
As bicicletas são usadas pelo pessoal da construção civil e adolescentes, geralmente homens... as poucas senhoras que usam bicicleta aqui no bairro são algumas nordestinas (uma, inclusive, usa um charmoso triciclo) e uma japonesa. Descendentes de japoneses são raros por aqui.
Não temos ciclovias, contudo o fato das mocinhas evitarem as "bicis" é bobeira. Elas são práticas, baratas (nem todas), econômicas e ecológicas, já servindo como forma de exercício físico. Para quem não tem carteira de motorista ou moto, é uma mão na roda.
Imagem daqui  

Segunda mão

Nestas férias, tenho tempo para ir toda quinta-feira à lojinha de usados da igreja aqui perto. Cabulo metade da tarde na oficina, peço folga ao "patrão".
Minha mãe e suas vizinhas são voluntárias, duas a cada tarde. Ali, torna-se  um ponto de encontro das senhoras idosas da redondeza, que vão doar e/ou comprar roupas, calçados, acessórios e utilidades domésticas, ou simplesmente prosear. Adoro as histórias de tempo antigo que elas contam.
Na semana passada, a esposa do primo de minha mãe contou sobre seu casamento "fugido". Era hábito fugir com o namorado para poderem se casar, porém ela tinha 14 anos e ele, 17. Não puderam se enlaçar, voltaram "murchos" para suas casas.
Não se contentaram, fugiram novamente. Então ficaram com a família dela, que era bem mais pobre que a dele, por isso a "italianada" dele não queria o casório. Só após um tempo, se casaram "no papel" e foram para o sítio dele, melhor estruturado.
Na primeira fuga, vieram para a cidade: cerca de sete km a pé, no inverno. Ela com um casaquinho e ele em mangas curtas, na madrugada gélida da roça. Enquanto venciam o mato do paraíso, que não acaba mais,  "viram" assombração, ouviram o tropel da mula-sem-cabeça. 
Chegaram de manhãzinha e bateram à porta da irmã dele, que se assustou. Acolheu-os, mas não deixou ficarem juntos (era assim). Ele foi tentar acertar papéis e nada conseguiu, foram devolvidos intactos.

Semana passada fui a pé até esse brechó, levei umas blusas que já não uso. Pela rua, fui observando e fotografando: É hábito local, deixar água ou resto de almoço na sarjeta, para cães soltos (ou de rua).
Ainda é comum as pessoas (mais velhas) deixarem seus cães darem uma volta pelo bairro, quando são vira-latas, apesar do risco de atropelamento.
Aqui em casa não deixamos restos nos pratos, e o que sobra do almoço guardo para o jantar (se ainda sobrar, congelo, faço sopinha, bolinho de arroz assado aos montinhos), mas ao limpar carnes, separo as rebarbas, ponho sobre um plástico e levo à calçada. Rapidinho se vai.
Na foto, uma senhora havia acabado de esvaziar a panela.
 Na esquina, já vem um grandão, me olhando ressabiado... ele tem dono, pois está de coleira. Bonito!
 Na volta: não havia sobrado nem o aroma.
Comprei estas lindas polainas. Estão novinhas e me servirão para trabalhar cedinho no inverno. Com a moto, as canelas sofrem... é assim, no verão se compra bons produtos invernais.
Também comprei esta bolsa de couro, bem acabada. É pequena, a tiracolo, especial para usar com moto. Fecha-se bem, com uma grande aba.
Por dentro, ela tem três divisões, uma delas com zíper. Dentro daquela de baixo,  há uma subdivisão também com zíper.
 Eu a lavei, sequei à sombra, engraxei duas vezes e guardei, pois a minha atual ainda está boa.
Devido ao horário de verão, ao voltar, às 17 h 30, ainda fiz meu pé sossegadamente. Em época de trabalho, tenho que fazê-lo às pressas, após o almoço de domingo, a cada 15 dias.
Detalhe - apenas tiro cutícula dos dedões! E fica bom do mesmo jeito.

27.1.14

Passado...

Revendo a prima de Santo André, com que passei a infância roceira, ela me disse ter visitado o antigo sítio do Vovô, onde morávamos; andou por tudo aquilo. Perguntou se já fiz o mesmo. Não!
Ando por lá, na garupa da moto do Par, fui na escolinha (abandonada), fui aos arredores, chego lá em cima, à porteira... mas adentrar o passado... não dá. Alguma coisa me amarra.
Voltei lá uma vez, dois anos depois, e já tinha passado pelo estirão da puberdade. Eu bem maior, o sítio encolhido. Me senti muito mal. Não precisava mais me apoiar para subir o "barrancão", a casa virou casinha, as "arvonas" se encolheram estranhamente.
A mãe dessa prima havia mudado para a "minha" casa, fez uma horta onde era minha casinha de bonecas, colocou móveis que não eram meus. Bagunçou minhas lembranças.
A prima já vivia na cidade, com as irmãs mais velhas. Dos 13 filhos da Tia, só 3 ainda estavam lá. A casa da Vovó sem moradores. Desolação.
Vou lá? Não vou... ela me disse que há uma bela piscina abandonada sobre o nosso terreirão de secar café (lá era nossa quadra de esportes). A casinha dela, a 1ª, foi demolida e no local há um lago com patos sem donos.
A casa da Vovó, ao lado da minha, fica aberta e pode-se entrar, zanzar pelos cômodos fantasmas. A minha está fechada, porém com uma faquinha se abre a tramela de pau. 
Ela não entrou no quartinho que eu dormia com meu irmãozinho (falecido) numa cama de casal e colchão de capim (comprado - um luxo), tendo um banco (azul? dois?) com alguns mantimentos nos sacos, o moedor de café torrado afixado nele (o aroma me vem), a máquina de costura onde minha mãe trabalhava e a baciona encostada no canto, onde tomávamos banho com sabão de pedra. 
No quarto da mãe, tinha a cama com colchão de palha de milho desfiada (que fincava na gente), o "guarda-roupinha" e uma linda cômoda, cheia de enxoval bordado por ela, ano após ano de mocidade.
A minha janelinha de tábuas dava vista à bica d'água e ao terreirão, tudo acima, à floresta sem fim, após o pasto e plantações. A janela da mãe via a chegada, no oposto, quando era tempo de seca e o mato tava baixo.
A mãe só deixava entrar até a cozinha durante o dia; era regra geral. Na sala, que tinha a cristaleira repleta de presentes de casamento e uma mesa de quatro cadeiras, só as visitas!
Mas à noite ficávamos lá, os quatro, eu e o irmãozinho sentados no chão sobre saco de estopa. A mãe chuleava roupas à mão (dava acabamento nas costuras) e o pai contava causos.
Depois o Mingas (da fazenda ao lado) ganhou TV e o pai se ia lá, toda noite; então a Lisalda, moça do outro sítio, vinha prosear com a mãe. 
Tinha vez que dava um vazio, uma melancolia... sobretudo quando as visitas iam embora, aos domingos à tarde ou em dias de chuva. A imensidão oca ganhava volume.
Na verdade, é que eu já iniciava os hormônios da puberdade, aos dez anos. Aquela dose extra de serotonina que toda criança ganha, estava no fim, escasseando.
Na sala e cozinha só havia portas, sem janelas. O piso era vermelhão; e nos dois quartos era tijolos assentados. No teto, só telhas com frestas laterais onde o vento passava, no inverno gelado. A mãe jogava água aos sábados, para desempoeirar.
Na cozinha havia o fogão de lenha (de vermelhão), uma mesinha com quatro cadeiras, a talha de barro para filtrar a água, muita lenha armazenada atrás da porta. Isso não podia faltar, eu repunha sempre, buscando feixes nos arredores. 
O guarda-comidas, onde ela conservava, embrulhados numa toalha de mesa, os pães feitos no sábado, para a semana toda. No inverno seco, na quarta-feira já estavam duros, mas tínhamos que continuar comendo ... no verão úmido, emboloravam à quarta-feira. Era assim em toda a roça: cortava-se os focos de bolor e comia-se o restante, sem desperdício.
Nessa cozinha não tinha panela de pressão, garrafa térmica. Tinha um lindo pano de saco com arame, que servia de tampeiro. As tampas ficavam lá penduradas à parede, muito prático. No pano, a frase bordada: "Vim de longe, de além mar, para te adorar". 
Fogão a gás? Só quando mudamos para uma fazenda próxima, vendendo o gado. Lá, meu irmãozinho ganhou caminha de armar e dormia na sala. Quarto todo prá mim! 
Geladeira? Quando morávamos na cidade a bom tempo tivemos uma emprestada, vermelha. Parecia um ninho: só com água e ovos. Que "metideza", beber água gelada; doía os dentes pela inexperiência.
O limoeiro, de onde fazíamos nosso único refresco, não sei se ainda vive... as galinhas se empoleiravam nele para dormir. As abelhas jataí que viviam no alicerce de pedras, embaixo de meu quartinho ainda existem?
O nosso jatobazeiro continua nos aguardando, ansioso... o coqueiro jerivá clama pela criançada. A amoreira, de amoras brancas e leitosas, ganhou estranhamente uma santinha aos pés. Lá tinha um caminho com líquens no barranco, que pareciam carpete.
A mangueirinha onde meu irmão foi atacado por abelhas, virou mangueirona, apenas com os quatis a degustar seus deliciosos frutos. A outra mangueira onde a irmã desta prima caiu e quebrou (braço ou perna) também está solitária e triste.
Os animais domésticos: galinhas caipiras, galinhas d'angola, perus, cães, gatos, vacas, porcos, a velha mula "Tesoura", sumiram num passe de mágica.
Minha prima marejou os olhos enquanto contava, disse que o aperto no coração é violento. O passado vem a galope e nos atropela. Como podíamos viver tão naturalmente? Tão bichinhos?
Me lembro do telhado rodando, com monstros me sobrevoando; alucinações devido a febres altíssimas. Sensação horrível. Não havia termômetros, nem anti térmicos. 
A outra irmã desta prima, também presente, lembrou-se de que a mãe a levava ao outro sítio, quase desmaiada de febre e caminhando, para o "Zé Flosino" dar-lhe injeção, com agulha rombuda que usava em todo mundo, sabe-se lá com que remédio vencido... 
Para chegar ao "nosso" sítio, pede-se a chave ao vizinho do sítio anterior. Na mesma porteirinha de arame farpado, há um tecnológico cadeado agora!

Sem imagens, nenhuma corresponde às minhas.

26.1.14

"Sampaulo"

Ontem, eu e o Par fomos ao aniversário de um Tio na capital (70 anos): Mais precisamente em Santo André (reduto dos Pavani). 
Uma das duas vans, com a parentalha daqui, passou 12 h 30 e nos devolveu às 2 h 00 de hoje. O motorista é  meu colega: trabalha do Departamento de Educação e faz "bicos" aos fins de semana. 
Meu pai fazia questão absoluta de não perder estas reuniões da família dele. Não estando mais conosco a três anos, fomos representá-lo. Foi nossa primeira vez com os Pavani de lá.
Já estive uma vez em casa da irmã mais velha do Par, lá próximo. Sempre evitamos a capital devido à má fama: inundações (nesta época), criminalidade, trânsito sempre engarrafado, porém ontem não encontramos nada disso.
O Par vai de vez em quando à capital a trabalho; já fui com ele. É e estressante dirigir naquele trânsito, e temos que nos preocupar o tempo todo com o "vizinho", quando estamos na rua, contudo o pessoal das empresas relacionadas à usinagem é tranquilo. Nunca nos tapearam e todos nos orientam no que for preciso. 
As principais diferenças com o interior estão relacionadas ao tamanho daquilo: tudo é mega. Passamos por São Paulo e São Caetano, antes de atingir Santo André. Não havia muito trânsito, por ser feriado na capital; viagem tranquila. 
Fico imaginando por que será os aposentados não se evadem daquela interminável cidade agitada e não procuram um lugarzinho com ar puro... até mesmo os descendentes teriam onde passar os fins de semana sossegados.
Os maravilhosos viadutos, metrô e vias suspensas "fura-fila", aparentemente não dão conta de escoar tanto trânsito. O rodo-anel, com pedágio, risco de paralisações por protestos e constantes assaltos (inclusive com arrastões e saques de cargas), é evitado.
O que mais chocou de início, foram os moradores de rua, vivendo em barraquinhas feitas com lençóis que nada protegem, nas calçadas e em pracinhas repletas de lixo. Não temos favelas aqui, nenhuma barraquinha dessas. Temos alguns mendigos que transitam pelo interior, mas são itinerantes.
A segunda diferença gritante, é que se muda de uma cidade para outra, sem sequer percebermos. Aqui, quando a cidade termina, há uma vasta zona rural, cheia de plantações e vaquinhas à beira da rodovia, até atingirmos a próxima. Uma delícia.
Seguindo interminavelmente pelas marginais de rios (Tietê e outros), não vimos uma casa com jardim. Muitos prédios são mal cuidados, as pistas são triplas e repletas de carros. Pessoas no farol tentando nos vender algo, poucas árvores nas calçadas. Vimos uma goiabeira, todavia sem um fruto sequer; nesta época deveriam estar verdes.
Santo André me pareceu melhor cuidada que a capital, com menos lixo e mendigos. O prédio mais suntuoso que vimos é um templo religioso, daquela igreja evangélica iniciada com a letra U. Aqui também há um daqueles.
Passamos também pela Universidade Federal do ABC, onde a filha de minha amiga daqui, foi trabalhar. A moça deixou o marido na casa e divide um apartamento por lá; eles se veem intercaladamente: sábado ele vai, sábado la vem. Loucura para os padrões interioranos.
O local alugado para a festa é amplo e bem decorado com motivos country: além do salão com 15 mesas, tem parquinho, quadra poliesportiva, cômodo para guardar pertences, churrasqueira, palco, bar com cozinha, TV das maiores. 
Serviu-se batata de festa, churrasco, arroz, pães e berinjela acebolada (não abusei). Bebidas incluía além da cerveja, refrigerantes, batida e sucos de caixinha, muita água e pinga. Fiquei na água, e o Par com 10 latinhas (não ia dirigir).
Por sobremesa, bolo e docinhos. Belisquei o bolo do Par e degustei demoradamente apenas um docinho... estou firme na reeducação alimentar.
Uma dupla caipira tocou modas de viola, que o tio adora, porém o som estava alto; difícil falar com tantas primas sobre tantas coisas. Somos 60 primos (paternos) e compareceram 20 e uns.
Dos doze filhos de minha avó, três estão mortos e duas faltaram. Meu pai tem 5 irmãs acima de 80 anos; 3 estavam lá, todas lúcidas, inclusive a mais velha, quase da idade de minha avó materna.
O filminho com a vida do Tio foi particularmente emocionante: com nenhuma foto da infância e adolescência (normal) e algumas da juventude. Ele foi o mais bonito dos quatro irmãos (minha avó dizia que o mais velho - quinto, que morreu de úlcera aos 20 anos, era o mais belo).
Meu pai, o tio Lia Elias (que faleceu ano passado) e a Vovó estavam numas fotos, o que aumentou a emoção.
O Tio contou de quando fazia "fusquinhas", na VW. Saía de casa 3 h 30 da madrugada e voltava às 20 h 00. Na semana do contra turno, saía 15 h 30, voltando de manhãzinha, às 8 h. Aos sábados não trabalhavam, mas as horas extras eram sempre "sugeridas". Só tinha vida, um mês por ano, nas férias, quando vinha com a família para cá, na casa da mãe.
Certa vez, na casinha de Itanhaém, ele foi sequestrado com um carro zero que tirou na fábrica. Trancaram-no no porta-malas. Enquanto seguiam, ele desmontou a fechadura e na primeira parada, correu pro mato. 
Na volta pra casa, lá pelas 23 h 00, observei o movimento da megalópole: muitos carros transitando, lanchonetes lotadas, pessoas a pé, sozinhas e casais... vi inclusive um casal com carrinho de bebê e criança puxada pela mão, em plena marginal. Eu pensava que as pessoas por lá não se aventurassem a tanto. 
Não vimos nenhuma batida policial, nada suspeitos nos semáforos, contudo não podemos facilitar: as primas de lá, disseram que a criminalidade é a maior preocupação, muito maior. Uma delas estava no carro com as três crianças e teve uma arma apontada na cabeça - passou imediatamente a bolsa. A outra, ouviu um homem gritando em sua calçada,  estava esfaqueado e morreu diante dela. A casa de praia em Itanhaém é invadida todo mês, levaram até o motor da geladeira velha.
Agora, tenho almoço (de massas) com a família do meu homem; levarei nhoque semi pronto. Não posso dar desculpa, ele foi na minha...
Imagem daqui  

24.1.14

Doenças Senis (demências)

O que antigamente se chamava de caduquice e hoje se generalizou para Alzheimer (envelhecimento acelerado do cérebro), são doenças cerebrais progressivas ou crônicas que acometem principalmente mulheres, sobretudo após os 65 anos de idade.
A demência degenerativa Alzheimer é responsável por mais da metade dos casos; o restante se divide entre cerca de 20 patologias, que podem ser sobrepostas (Alzheimer com alcoolismo crônico, por exemplo): 
As doenças vasculares: AVCs, aneurismas, uso crônico de cocaína, etc, compreendem a segunda maior causa, sendo mais comuns em homens.
Demência também degenerativas: dos corpos de Levy, doença de Pick, mal de Parkinson.
Traumatismo cranioencefálico (demência pugilística, acidentes, etc.); medicamentos mal administrados e de uso crônico, etc.
Infecções (HIV, Meningites, encefalites, sífilis neurológica, etc.); doenças metabólicas (da tireoide, insuficiência renal e hepática, etc.
Falta de oxigenação cerebral (doença cardíaca, insuficiência pulmonar, arteriosclerose, etc.).
Deficiências de vitaminas (B1, B12 e ácido fólico); tumores cerebrais; Intoxicações (alcoolismo, metais pesados, etc.); 
Os sintomas mais comuns e geralmente progressivos são:
Perda da memória, confusão mental e desorientação; dificuldade em compreender comunicação escrita ou verbal; em tomar decisões ou encontrar as palavras; em reconhecer familiares e amigos; esquecer fatos comuns, como a data atual; alteração da personalidade e do senso crítico; depressão, ansiedade, insônia, desconfiança, delírios e alucinações.
Também ocorre agitação (noturna); falta de apetite e perda de peso, incontinência urinária e fecal; dificuldade em dirigir; perder-se em ambientes conhecidos; fala repetitiva / movimentos repetitivos; dificuldade nos cuidados pessoais (cozinhar, fazer compras).
O diagnóstico necessita de anamnese, sinais clínicos, observação familiar e exames como: hemograma; teste de função renal, hepática e tiroidiana; dosagem sérica de vitamina B12 e ácido fólico; sorologia para sífilis; glicemia de jejum; tomografia computadorizada de crânio ou ressonância magnética.
O tratamento na fase inicial inclui inibidores da acetilcolinesterase, antidepressivos, estabilizadores de humor ou neurolépticos, e tratamentos de fisioterapia e terapia ocupacional, assim como orientação à família e cuidadores, mantendo-o ativo, participando o máximo possível nas atividades diárias e de comunicação, a fim de preservar certas capacidades do doente. 
Prevenção: alimentação saudável, atividades físicas, cultura e lazer, evitar álcool e fumo, controle da pressão arterial e diabetes, rotina regular de sono, manter a mente ativa (leitura, resolução de problemas diários, trabalho).
Fontes: aqui , aqui , aqui e observação de minha avó senil, com 91 anos.

23.1.14

Elogios

Logo recomeçam as aulas e estou cá, me preparando. Chegando novinhas, de uma "escolinha", as crianças precisam de elogios, de limites, de cafuné, de firmeza. 
Necessitam de exemplos positivos: de mim e sobretudo dos coleguinhas, com quem aprendem mais rápido (o bom e o ruim) nesta nova escola, grande e assustadora. 
Os limites precisam ser aplicados sobre a ação, não enfocando a criança em si; assim:
_ Eu gosto de você, porém detesto quando você chuta um coleguinha. Essa ação negativa, terá consequência negativa.
Massagear com uma pomadinha o local que ficou vermelho, no colega, é uma forma da criança reparar seu erro e perceber o sofrimento do outro. Surte muito mais resultado que ficar no canto, pensando (em outras coisas).
Ficar pensando num canto é bom para acalmar as birras, os escândalos que incomodam os outros. Nestes casos, ficar um pouco à parte é benéfico (sobretudo para os demais), ali na escola ela não é única. 
Retirar a criança da sala, abaixar-se à altura dela, no corredor, e falar firme, é uma boa tática nos casos mais sérios. Ela fica mais "balançada" e tende a prestar mais atenção nos fatos.
Os cafunezinhos na cabeça, passando de um a um, enquanto trabalham, reforçam o pertencimento. Dar, sempre que possível, duas opções de escolha, fará com que ela aprenda a escolher, argumentar, decidir por si.
As críticas devem ser feitas ao ato, e não há criança em si. "Aqui nesta atividade há um problema" e nunca  "você é um problema".
A firmeza diz respeito às regras: poucas, contudo cumpríveis. Trocar a palavra "não" pela palavra "evite" faz com que a criança não fique sempre "do contra". Exemplo: "evite chutar o colega" - se disser: "não chute", ela pode chutar apenas para contrariar.
Quanto aos elogios, também não podem ser dirigidos à criança, e sim às ações: "você é lindo,  inteligente, é esperto,  caprichoso, carinhoso" são termos vazios, que massageiam o ego e estimulam a preguiça e sobretudo o medo de errar (e deixar de ser tudo isso). Essas interpretações não são ações palpáveis e levam à instabilidade emocional, à dependência de um adulto.
Devemos estimular o esforço, a persistência, a tentativa, a ajuda ao outro, o carinho real que ofereceu ao coleguinha, a dizer a verdade - seu ponto de vista, para que continue a haver ações cada dia mais evoluídas. A autonomia emocional (resistência à frustração) será alcançada pouco a pouco.
É importante demonstrar a evolução à criança, a ação positiva e seu resultado concreto, e refletir com ela no sentido dela também se conscientizar para o avanço real.
Pense num atleta: se já bateu um recorde, fica desestimulado, com medo de tentar novamente e decair. Todos que estão sobre o topo ficam mais frágeis, e queremos crianças fortes, determinadas, que evoluam. 
O aperto de mão, para selar um acordo, firme e decididamente, ensinando a criança a colocar ênfase e força, surte bom resultado porque ela se sente menos bebê com o importante ato simbólico e tende a cumprir o combinado.
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22.1.14

Meu primeiro banho...

Sim, hoje tomei minha primeira chuva de janeiro, que nunca vi tão seco! Motoqueiros não escapam das pancadas de verão, porém desta vez custei a utilizar a capa.
Saí de moto, circulei por vários pontos da cidade com a serra toda esbranquiçada, raios e trovões rodeando a periferia, tempo medonho atacando a zona rural a sul e sudeste.
Quando saí do último estabelecimento comercial que visitei, vi o aguaceiro se aproximando. Peguei logo a capa e já estava molhada quando terminei de me vestir. O sol forte em meio ao pancadão, persistia incrédulo.
Após dois quarteirões, sobrou apenas sol, bem ardido. Estacionei e tirei a capa, que fica guardada no baú da moto, para me socorrer... E não é que circulo por mais quatro quarteirões e a chuva volta com tudo?
Encostei embaixo duma árvore, recoloquei a capa e cheguei em casa com enxurrada forte. O sapato está ensopado até agora, contudo estou indo prá casa (aqui ao lado). Foi uma festança molhar-me um pouco, com este calorão!
Agora o tempo está fresquinho, todavia a pista de terra para corrida está intransitável... acho que vou caminhar noutro canto.
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Sete vezes ao dia

Na reeducação alimentar, ela não pode faltar de jeito nenhum: o primeiro copo, em jejum, deve receber (poucas) gotas de limão, pois a vitamina C ajuda na desintoxicação. Eu prefiro as gotas de limão mais tarde, após alguma refeição.
Entre as seis refeições diárias, cinco copos grandes d'água vão hidratar amplamente, diminuindo de forma drástica, a vontade de comer doces e até mesmo carnes (que uso como um temperinho). 
O último copo, antes de dormir, tomo com canela (mas tomo cuidado com o excesso), ou qualquer erva aromática esmagada (fresca ou desidratada). Não se trata de chá.
Com esta intensidade, diminui-se sobremaneira o desejo por café, sucos ou refrigerantes, sendo que o suco feito na hora, preferencialmente com mais de um ingrediente, pode substituir uma das seis refeições. 
Há vários chás que auxiliam na inibição do apetite, são diuréticos, desintoxicam e ajudam a emagrecer. Eles podem entrar também numa das seis refeições, com três biscoitos ou torradas integrais, mas eu evito adoçante.
Em certos casos, não se deve usar adoçantes em produtos quentes. Às vezes, uma pitadinha de açúcar mascavo ou mel, é melhor. Em última instância, a stévia deve ser preferida, ou mesmo um rodízio de adoçantes diversos.
Bebidas light e diet contém muitas químicas cumulativas, sobrecarregando o fígado e intoxicando o organismo. Estou tentando me acostumar com o sabor natural dos alimentos, diminuindo pouco a pouco sua docicidade.
O principal é que a água me acalma, diminuindo a ansiedade, e principalmente o "comer compulsivo", pois o estômago sempre estará forrado.
Prefiro a água filtrada e não engarrafada, pois a água dessa região é boa (águas engarrafadas podem conter doses de semimetal arsênico, sódio ou nitrato acima do recomendado).
Ler os rótulos de algumas variedades de água mineral e pesquisar seus componentes na net, verificar a validade e os sites das empresas, é importante para a saúde, evitando comprar-se gato por lebre (alcalinas e com vanádio são bem recomendadas).
A água mineral in natura, eu tomo direto na fonte, mas não deve ser confundida com aquela engarrafada, que viajou dezenas de quilômetros ao sol, foi acondicionada em locais quentes e a fonte é suspeita.
É hábito desta região, ir à Águas da Prata (pertinho), uma vez por semana, e pegar água mineral grátis, que jorra desavergonhada nas fontes. O problema é que se armazena fora da geladeira, em cozinhas quentes, e bactérias podem proliferar (pois não há cloro).
Minha avó não toma água com cloro, pega água na zona rural, mas filtra antes de usar.
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20.1.14

Blanche XLVI

O mormaço de verão baforeja a montanha dos caprinos. Dia claro e gargalhoso, com a branca lua cheia a espreitar pelo cantinho  do céu. Blanche propõe a Tom que conduza o indiozinho consigo no mergulho à piscina natural, no decurso em que ela alinhava o aromático ensopado de lebre.
Todinho encabulado, porém solícito, ele acode a ideia e ambos dirigem-se à tulha. Ela concede panos, roupa limpa e sabão, num áspero balaio de palha, daqueles que se prende balançadinho à cintura. É hábito este banho caprichado, todo final de sexta-feira, devido à descida da serra ao sábado.
O garoto, aclimatado ao nado cotidianamente, levantou-se arrebatado, com adminículo de Tom e do rijo cajado. Um olharzinho sorridente flechou-os farrista. Externamente, a chaga encontra-se cicatrizada, contudo o padecimento ósseo denuncia que a perna ainda inspira ponderação.
Agarrado ao franzino, porém robusto ombro esquerdo de Tom, segue manqueteando morosamente pela picada curta, com fortuna mesclada a apreensão. Blanche lhe emite um bonitinho sinal de ânimo e volta a seus quefazeres, na estreita cabana de troncos.
Instalam-se cautelosamente à oposta borda d'água, sob o primário degrau da cachoeira límpida, com frescos respingos a lhes cutucar. Neste lance inicial, como quem ensaia a se despencar, a poética queda d'água, apesar de alargada, não atinge meros dois metros de altitude.
Diversas rochas deslocadas em volta do poço, permitem transpô-lo aos pulinhos, de lado a outro. A mata ciliar sombreia as margens e confere sensação (falsa) de acolhida: pisar em penedo úmido, recoberto por lodo, é tombo quase certeiro, com possível sisudez.
Seguindo abaixo pelo planalto, a cerca de duzentos metros do  vertiginoso despenhadeiro, com mais três quedas absurdas, o regato espraia-se capilarmente, de abraços com o majestoso pedregal. É ali que Blanche iliba roupas, quarando-as ensaboadas ao sol e batendo-as na fraga, a fim de desencardi-las.
Tom, com a inconveniente timidez queimando-lhe a face, esfrega parte após parte, o tenro corpo nu do adolescente, com sabão e bucha natural. O deslizarzinho da espuma camufla o desconforto que sente ao toque num corpo humano.
O mocinho, habituado a constantes atividades grupais, age com a naturalidade devida, indicando-lhe os locais que requerem maior zelo: as costas e os pés. O restabelecimento do peso devolveu-lhe a maciez juvenil, afinal. Após semanas acamado, seus pés varonis tornaram-se sedosos e graciosos.
Para o enxague, Tom, posicionado com as pernas descerradas ao interior do tanque, todo ele encafifado, pega-o cuidadosamente nos braços e o deposita numa pequena laje submersa. Sem vacilo, o rapazote sai nadando desenvolto naquele bolsão d'água, com cerca de dez metros de diâmetro. 
A cena, espontaneamente estética, tira o fôlego de Tom, não apenas pela lindeza daquele corpo translúcido, contudo também pelo nítido benefício que a água demonstra na reabilitação do alanceado. Faz agora sua própria assepsia, entremeando furtivos olhares atônitos àquele ser transformado em brilho, que esbrangeu a barreira do universo físico: galgou uma dimensão onde é exclusivo, pleno, perfeito. 
Mergulhando e emergindo, o indiozinho avança mais e mais, sofregamente a nadar, num impulso desvairado em reaver-se, reassumir-se. Tom, prostra-se de bruços na laje seca, com o sol a absorver-lhe a água do banho, não ousa quebrar aquela magia, não ousa adentrar a cena. Mantém-se à orla, como quem admira, suspenso no tempo, uma tela famosa.
Afadigada do aguardo, lá da varanda, Blanche desata a gritar, arreliada já. Tom desperta da hipnose e conclama o púbere, que também volta a si. Arrastado à laje com airosidade, se enxuga desajudado, e com ânimo ímpar se escora no amigo para vestir-se e voltar.
Retornam silentes, porém perturbados, cada qual por seus motivos, quando Blanche os avista e admoesta irritada: o almojantar passa do ponto. O primordial ato de Tom, para acalmar-lhe os sobressaltos, é correr cachimbar, perdidão em dúvidas, suas lisérgicas e acalantadas cascas de bergamota.
Após a minguada refeição, devido ao desapetite, egressa-se ligeirinho, afobado, deixando a cargo de Blanche realocar o rapaz à tulha, para o descanso noturno. O menino cantarola, já na trilha, e ela percebe a atmosfera festiva... nada cita, apenas compreende que a ablução passará a ser diária, por fins terapêuticos. 

19.1.14

Zelando

Estávamos só eu e o Par no sítio, além dos primos que moram por lá. O sono foi com cobertor e pijama longo, a madrugada na serra é fria. Voltamos antes do almoço para que eu zelasse pelos alimentos que trouxe.
Tinha tanta coisa, que não caberia na geladeira, preferi vir com tempo para preparar tudo. Fiz saladão de chuchu, casquei muitas mangas e bati a polpa; também fiz polpa com as goiabas.
Ajeitei as bananas para madurarem, assim como os mandacarus, mais mangas e uma bela graviola que eu e a vizinha havíamos pegado (avisei à ela que é azeda, por isso perde-se tudo no pé)...
Fiz salada de pepino, abobrinha refogada e quiabo no vapor, que estavam na geladeira ocupando espaço, onde guardei os limões e mangas ainda "de vez". Preparei um arroz, descongelei um potinho de carne, e pronto. Almoço de domingo para dois - "Fiotão" estava em SP a estudo.
Também demorei limpando toda aquela canela, por isso preferi trazer agora, que estou de férias. Após lavar toda a louça e por uma máquina de roupas para lavar, já eram 16 h 00. O dia rendeu!

Ontem, antes de ir à serra, tingi uma toalha de crochê que estava desbotada, sem vida.
 Esta lata, que peguei na oficina, fica guardada para este fim.
 "Cozinhando" a toalha a fogo baixo...  Deixei secando à sombra e hoje vi o resultado.
 O azul marinho sobre vermelho, deixou um tom de azul carbono, revitalizando a peça.
Agora, vou pendurar roupas ao varal...

Jaracatiá

Ontem fomos dormir no Mamonal (sítio da avó na serra), após um mês e meio de ausência. Meus vizinhos ficaram lá conosco até anoitecer.
O primo, dono "da venda" vez bauru grátis: comi meio, sem refrigerante. Antes porém, fui à cata: peguei três dúzias de limões; aproveitei algumas pencas de bananas de dois cachos que estavam perdendo ao pé.
Após estourar gostosas castanhas de coquinho jerivá,  fui com a vizinha buscar mangas e canela no sítio do Tio. Trouxe quatro qualidades de mangas: duas nossas e duas do Tio, estavam se perdendo.
Colhi goiabas, porém ainda estão no início. O primo deu cebolinha e chuchus, que estavam lindos no jirau.
Hoje, ao caminhar pela pastagem, na trilha das vacas, encontrei pés desta frutinha: JARACATIÁ (nome dado pelos índios que aqui viviam).
São do tamanho do dedo polegar, e o caule do arbusto serve para fazer doce, o famoso doce de pau, que nunca comi, mas conheço a fama.
O caule, igual de mamoeiro, é descascado e ralado. Igual doce de laranja e cidra, fica uma semana de molho para sair o amargor, trocando-se a água; então é espremido dentro de um saco de pano e vai ao fogo sobre açúcar caramelizado. Parece cocada. Um dia, ainda hei de fazer o famoso "doce de pau"!  
Aqui, o jaracatiá mordido por mim: tem cheiro de mamão, gosto de mamão, sementinhas de mamão e mina leite como mamão. Come-se com casca e tudo; duas mordidas e se acaba. Na garganta, fica um leve geladinho, devido ao leite. 
É mais doce que o mamão; na verdade, é o seu ancestral, antes do homem realizar melhoramento genético. Eu comi vários ao longo do percurso, em três pés que encontrei. Nesta época de verão, várias frutinhas silvestres estão no ponto.
Também encontrei mandacaru (cacto), esta fruta que parece demais com sorvete de flocos,  é prima da pitaia. Na foto: flores secas e murcha, miolo delicioso, fruto semi descascado, e as cascas que sobraram. 
Trouxe um pouco "de vez", para madurarem na fruteira. Os maduros, a passarada devora, depois sai plantando cacto com os bumbuns! Há uma árvore dormitório, onde formou-se um anel de cactozinhos em volta, interessante.
Nestes pés, o fruto é amarelado e estava carregado; noutro local (no lajeado de pedras), é vermelha e este ano não deu quase nada. Este é o post do ano passado.
Colhi canela para o ano todo, pois as minhas se acabaram. Raspei os musgos, lavei e estão secando: hoje ao sol, depois à sombra.
Eu e o Par, tomamos água de canela uma vez ao dia (não recomendo em excesso, nem para quem sofre de hipertensão arterial). A canela é um dos temperos mais benéficos do Planeta, e deixa a água gostosinha.
Também achei melõezinhos. Ao serem colhidos, se abrem sozinhos. A florzinha amarela murchou, a rama é como melão de verdade, trepadeira. Chupei alguns e deixei as sementes brancas, são docinhos e enjoativos. Essas folhas de bananeira secas, são eficientes guardanapos naturais, após comer fruto do mato.
Também comi "milho de grilo", mas não trouxe para fotografar. Esta imagem é da Net. São roxos por fora e brancos por dentro, com semente, doces e sem graça O arbusto tem cerca de meio metro de altura. 
As pimentas comari também estão quase maduras, há por toda parte e ficam ótimas em março. Ajudam a emagrecer, mas ardem nos olhos após ingeridas, e atacam a gastrite. São "quentíssimas"! foto da Net.